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Produtos cárneos emulsionados: quais os cuidados necessários no processamento?

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Os embutidos cárneos emulsionados, também comumente chamados de produtos de massa fina (devido ao alto grau de moagem ou cominuição) se destacam como produtos cárneos de maior industrialização e elevado consumo no país, considerados parte integrante da dieta dos brasileiros. Consumo facilmente justificável pela ampla aceitação e por possuírem custo acessível a maior parte da população. Como exemplos desta categoria de produtos podem-se citar salsichas, mortadelas e salsichões, consumidos tanto em nível doméstico como no mercado de alimentação rápida ou fast foods.

Os produtos embutidos emulsionados industrializados são obtidos a partir de emulsões cárneas de uma ou mais espécies de animais de açougue, adicionados de ingredientes, embutidos em envoltório natural, ou artificial ou por processo de extrusão, e submetidos a tratamento térmico adequado (BRASIL, 2000). Entre os principais ingredientes que podem ser usados para a produção estão: carne (bovina, suína e/ou de frango), gordura e/ou toucinho, proteína isolada de soja, sal, sais de cura (nitrito e nitrato), antioxidantes (eritorbato de sódio, extratos naturais), tripolifosfato de sódio, temperos (pimenta branca, noz-moscada, entre outros) e aceleradores de cura (eritorbato de sódio ou ascorbato de sódio).

O que seria uma emulsão cárnea?

A emulsão cárnea, também chamada de “batter cárneo”, pode ser descrita como a mistura finamente fragmentada ou cominuída de proteínas musculares, partículas de gordura, água, sal e outros aditivos que resultam em massa homogênea. Partículas esféricas de gordura são recobertas com uma fina camada de proteína solúvel. As proteínas solúveis dissolvidas na fase contínua (aquosa) são os agentes emulsionantes da carne, particularmente as miofibrilares, que apresentam alta funcionalidade (97% da capacidade de retenção de água e 75% de sua capacidade de emulsificação), embora as sarcoplasmáticas (menos eficientes) também contribuam para a estabilidade da emulsão.

A proteína funcional que desempenha um dos papéis mais importantes para as carnes e para os produtos cárneos é a miosina, além do complexo actomiosina. Isto se deve à sua estrutura bem equilibrada, além de uma grande e longa estrutura fibrosa. A miosina é capaz de formar géis altamente elásticos e coesos em uma matriz proteica, e ainda, uma membrana firme ao redor dos glóbulos de gordura em batters cárneos. As proteínas miofibrilares requerem uma força iônica mínima de 0,5 M para sua solubilização, porém, esta condição é usualmente encontrada em produtos cárneos processados onde geralmente se utiliza em torno de 2% de sal. Dentre as propriedades funcionais mais importantes das proteínas miofibrilares pode-se citar: emulsificação, solubilidade, gelatinização, viscosidade, capacidade de retenção de água, capacidade de retenção de gordura e retenção de flavor.

Formação da emulsão cárnea

Uma típica formação da emulsão cárnea consiste basicamente em duas transformações: a primeira, seria a absorção de água pelas proteínas e o seu inchaço ou intumescimento juntamente com a formação de uma matriz viscosa e a segunda a emulsificação das proteínas solubilizadas, glóbulos de gordura e água. A formação de uma matriz viscosa na emulsão cárnea, provocada pelo intumescimento das proteínas, estabiliza a gordura e a estrutura dos produtos acabados pela imobilização da água livre, o que previne a perda de umidade durante o tratamento térmico. De modo prático, a formação de uma emulsão cárnea consiste em submeter os ingredientes (matérias-primas cárneas, gorduras, água, sal e aditivos) a uma mistura eficiente, como a fragmentação ou cominuição no cutter o que irá resultar em uma massa cárnea estável com características de uma emulsão de gordura em água.

Duas teorias explicam os mecanismos de estabilização dos produtos cárneos emulsionados: a da emulsão e a do aprisionamento físico, na qual as partículas de gordura não se separam devido à formação de uma rede proteica que retém essas partículas, juntamente com a água.

Fatores que afetam a formação e estabilidade da emulsão cárnea

A estabilidade final de um batter cárneo ou emulsão se constitui como o principal fator de qualidade de um produto cárneo emulsionado. A estabilidade está relacionada com a retenção de água e gordura e a obtenção da textura final desejada. Numerosas energias de ligação e outras forças físicas são essenciais para manter a estabilidade durante e após o tratamento térmico.

Diversos fatores podem influenciar na estabilidade do batter cárneo: tipo e condições do equipamento utilizado, temperatura durante o processo de emulsificação, tempo de emulsificação, tipo e tamanho das partículas de gordura, pH, quantidade e tipo de proteína solúvel, força iônica, viscosidade da massa, controle da temperatura de cozimento, entre outros. Como mostra a Figura 1, os fatores que afetam a estabilidade da emulsão cárnea influenciam decisivamente na qualidade e rendimento final do produto cárneo.

Diagrama esquemático dos principais fatores que afetam a estabilidade de emulsão (Adaptado de ALVAREZ et al., 2007)..png

Fig.1 Diagrama esquemático dos principais fatores que afetam a estabilidade de emulsão (Adaptado de ALVAREZ et al., 2007).

Temperatura

Durante a trituração, a temperatura da emulsão aumenta em consequência da fricção das lâminas do equipamento. É conveniente certo aquecimento porque ajuda a liberação da proteína solúvel e acelera o desenvolvimento da cor de cura. Porém se a temperatura aumenta demasiadamente durante a fase de emulsificação, a emulsão se rompe no tratamento térmico subsequente. A elevação excessiva da temperatura diminui a viscosidade da emulsão cárnea e favorece a coalescência das partículas de gordura, ou a fusão destas partículas (formando gotas maiores de gordura), o que promove aumento da área superficial, aumentando a demanda por proteínas para recobrir esta área de forma a garantir a estabilização da emulsão cárnea. A redução da viscosidade da massa, juntamente com a fusão da gordura, permitiria uma maior movimentação das partículas de gordura que, desta forma, tenderiam a migrar para a superfície da massa da emulsão. Por este motivo, um controle adequado do tempo de trituração no cutter, assim como a manutenção preventiva do equipamento, com lâminas com corte adequado, é fundamental para garantir a estabilidade posterior dos produtos.

pH

A máxima capacidade emulsificante das proteínas miofibrilares se encontra próxima a neutralidade. O aumento do pH proporcionado por exemplo, pela adição de polifosfatos aumenta a solubilidade das proteínas, o que reflete na sua capacidade e facilidade de formar a matriz proteica e envolver os glóbulos de gordura. Maior quantidade de proteínas miofibrilares é extraída quando se eleva o pH, o que permite a formação de emulsões mais estáveis.

Gordura

A gordura desempenha papel importante na estabilização de emulsões, reduzindo as perdas no cozimento, aumentando a capacidade de retenção de água, fornecendo suculência, além de ter papel crucial nas propriedades estruturais dos produtos cárneos. Um produto estável pode ser caracterizado pela mínima separação de água e gordura. Temperaturas elevadas podem favorecer a fusão das gorduras. O ponto de fusão da gordura varia de acordo com sua composição e é influenciada pela espécie animal e localização anatômica. A maioria das gorduras contém alguma fase líquida a temperaturas superiores a 22ºC e a temperaturas de 34 a 52ºC, praticamente toda gordura é convertida em líquido. É recomendado que a temperatura da emulsão não ultrapasse 16ºC. Temperaturas inferiores providenciam maior margem de segurança e usualmente são recomendadas nos processamentos.

Tipo de gordura

O tipo de gordura empregado em emulsões cárneas afeta consideravelmente a sua estabilidade uma vez que a fusão da gordura contribui para que a emulsão se desfaça. Gorduras insaturadas tendem a produzir emulsões com menor estabilidade: por apresentarem menor ponto de fusão, liquefazem mais facilmente, aumentando a superfície relativa a ser encapsulada pelas proteínas. Se a disponibilidade de proteínas miofibrilares não for suficiente para o encapsulamento e formação da matriz, ocorrerá a livre movimentação e coalescência ou fusão dos glóbulos de gordura. Gorduras saturadas, com alto ponto de fusão, tendem a produzir emulsões mais estáveis.

Tamanho da partícula

O tamanho da partícula de gordura influencia a sua superfície relativa, atuando sobre a superfície a ser envolvida (encapsuladas) pelas proteínas. Como a redução do tamanho da partícula aumenta a sua área superficial, maiores quantidades de proteína solúvel serão necessárias para encapsular estas partículas menores. De um modo geral, quanto menor for as partículas de gordura, mais estável a emulsão, desde que haja quantidade suficiente de agente emulsionante (usualmente proteínas cárneas) para recobrir todas as partículas.

Disponibilidade proteica

As proteínas miofibrilares, solúveis em solução salina, são as principais responsáveis pela capacidade emulsionante e pela capacidade de retenção de água nos produtos cárneos emulsionados. As proteínas sarcoplasmáticas também formam o filme proteico no processo de formação da emulsão, embora menos eficiente que as miofibrilares. Já as proteínas do estroma (tecido conectivo), principalmente o colágeno, não são adequadas para o preparo de emulsões. É desejável que as emulsões cárneas não apresentem mais de 25% de colágeno no teor de proteína total.

Quanto maior a disponibilidade de proteínas para o processo emulsionante, mais estável será a emulsão; mais proteínas estarão presentes para encapsular os glóbulos de gordura e integrar a matriz proteica (que impede a livre movimentação e coalescência dos glóbulos não encapsulados).

Viscosidade

A viscosidade da massa cárnea a emulsionar relaciona-se diretamente com a estabilidade da emulsão, e pode ser explicada da seguinte forma: existe uma tendência das moléculas de gordura migrarem para a superfície, uma vez que são menos densas que a fase aquosa contínua. Portanto à medida que a viscosidade diminui, a tendência das moléculas de se separarem aumenta. Ou seja, com a diminuição da viscosidade, diminui a estabilidade da emulsão, ocorrendo uma tendência de migração da gordura para a superfície do produto.

Consequência da perda de estabilidade da emulsão cárnea: a quebra de emulsão

Um relevante parâmetro para a indústria processadora de carnes é a emulsão estável, da qual a gordura não se separa durante o cozimento.

Caso os diversos fatores que interferem na estabilidade da emulsão cárnea não sejam devidamente controlados poderá ocorrer a “quebra da emulsão”, ou seja, a coalescência dos glóbulos de gordura. Normalmente, tem início durante a etapa de cominuição e, se consolida na etapa de cozimento, mas pode ser somente percebida após o resfriamento. Formam-se bolsões de gordura na superfície ou no interior do produto. Pode ocorrer migração da gordura para as extremidades, ou apenas migrar para a superfície, tornando-a oleosa, o que é mais comum.

Conclusões

Produtos cárneos emulsionados são produtos populares, com custo acessível e amplamente aceitos, contudo, é essencial que se aplique uma grande variedade de princípios tecnológicos adequados para se garantir produtos finais de qualidade, com textura, aparência, sabor e aroma desejáveis. É imprescindível que a indústria cárnea tenha controle de todos os parâmetros, que muitas vezes são complexos, para fornecer aos consumidores produtos padronizados com elevado nível de qualidade, além dos cuidados não abordados aqui, mas não menos importantes, de inocuidade e segurança microbiológica.

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