Há uma frase famosa que diz que mudanças acontecem quando menos se espera. Ainda que muitos considerem essa expressão um clichê, a verdade é que ela se aplica perfeitamente ao que todos nós vivemos a partir de março de 2020. A chegada da pandemia ao Brasil impôs mudanças de comportamento que rapidamente se transformaram em novos hábitos de consumo, exigindo que diferentes indústrias corressem para se adaptar às novas e profundas mudanças no mercado consumidor – sendo isso duplamente verdadeiro no setor de alimentos.
No fechamento do segundo semestre do ano passado, mais da metade da população economicamente ativa estava fora do mercado de trabalho no país, considerando postos formais e informais, segundo dados do IBGE. Na outra metade, muitos brasileiros tiveram o seu salário reduzido, consequentemente limitando o seu poder de compra. Soma-se a isso o auxílio emergencial oferecido pelo governo a partir de abril e descontinuado a partir de janeiro deste ano.
É neste cenário que fabricantes de alimentos e bebidas terão que navegar nos próximos meses. Com o poder de consumo de alguns extratos sociais bastante fragilizado, já é possível notar alguns consumidores alterando o seu padrão de consumo e dando preferência a produtos mais acessíveis. Para a indústria de alimentos, isso significa que um olhar atento a estratégias de precificação será cada vez mais importante, sobretudo no caso de produtos populares na cesta básica do brasileiro.
Porém, na outra ponta há um segundo grupo de consumidores menos impactados pela pandemia em termos financeiros e que tem demandado inovações da indústria. Neste caso, são pessoas buscando manter um estilo de vida saudável e que têm investido em produtos que de alguma forma contribuam para o bom funcionamento do corpo e para o fortalecimento do sistema imunológico, trazendo oportunidades importantes.
Não coincidentemente, já é possível notar nas gôndolas dos mercados mais produtos que se destaquem pelo maior valor nutricional, como bebidas com alto teor de proteína e bebidas lácteas enriquecidas com vitaminas e fibras. Essas são novidades que se juntam a outras que já estavam à disposição do consumidor, como produtos à base vegetal e chás funcionais, mas que agora ganham um novo impulso em virtude dos desafios e preocupações trazidas pela pandemia.
Nessa esteira, mesmo categorias maduras estão experimentando um novo ciclo de crescimento, a exemplo da água mineral. Segundo a Kantar, de janeiro a outubro de 2020 a categoria registrou expansão de 20% em volume consumido. A expectativa é que o bom desempenho se mantenha nos próximos doze meses, havendo espaço para mais inovações, como o desenvolvimento de águas saborizadas ou o lançamento de novas marcas em tamanhos e tipos diferentes de embalagens.
Fora isso, na expectativa do início da campanha de vacinação no País e considerando o tempo necessário para imunizar uma parcela significativa da população, é preciso ter em mente que 2021 trará oportunidades e desafios similares ao que vivemos no último ano – ou, pelo menos no primeiro semestre, não devemos esperar um cenário muito diferente do que vivemos no ano que passou.
Neste sentido, o sucesso de fabricantes de alimentos e bebidas em 2021 estará diretamente atrelado à capacidade das marcas em demonstrarem resiliência e em estarem atentas às mudanças no mercado consumidor. Afinal, a depender do caminhar das campanhas de vacinação no país e da velocidade com que imunizantes cheguem a diferentes estados, é possível que tenhamos realidades completamente distintas de norte a sul, o que exigirá estratégias diferenciadas da indústria no esforço de posicionar e distribuir os seus produtos.
Isso inclui o investimento em canais de e-commerce e a estruturação de redes robustas de logística. A exemplo do que ocorreu no ano que passou, o comércio eletrônico de alimentos e bebidas deverá se manter em alta em 2021, abrindo caminho para que as marcas preparadas para atuarem no canal ampliem a sua estratégia de distribuição.
Sendo assim, os pilares que devem nortear a atuação de fabricantes de alimentos e bebidas nos próximos doze meses são: revisão de estratégias de precificação, sobretudo nos produtos que compõem a cesta básica do brasileiro; capacidade de inovação e diversificação de portfólio, tendo em mente a maior busca por saudabilidade; a disposição das marcas em desenhar estratégias regionalizadas que levem em consideração o estágio da pandemia em diferentes estados; e, por fim, a capacidade de investir em redes de distribuição via e-commerce.
Certamente, 2021 não será um ano simples. Mas diferentemente do ano que passou, ele deve ter um pouco mais de previsibilidade. Ainda será preciso acompanhar de perto a dinâmica do mercado consumidor e se adaptar rapidamente às novas demandas, mas esperamos que agora sem os sobressaltos que marcaram o ano encerrado em dezembro.