A Naveia foi fundada com a promessa de entregar mais sabor aos leites vegetais. A dificuldade das bebidas anteriores em cumprir esse desafio fez com que muitos consumidores se afastassem das soluções do tipo.
Mas, com o tempo, a solução aconteceu. E o leite de aveia passou a ser incluído no ritual sagrado do brasileiro, de misturar o café com leite, além do acréscimo da bebida em outras misturas celebradas no país.
“No passado, a gente olhava para os leites vegetais que tinham no mercado, eles tinham muitas aplicações interessantes, mas na hora de misturar com café assustava muito as pessoas, porque não era uma experiência agradável, ficava aguado, coalhava, não era uma experiência parecida com o do leite de vaca”, diz a sueca Alexandra Soderberg, co-fundadora e CMO da Naveia.
“Hoje, o leite de aveia permite essa experiência”, garante a executiva. “A gente tem até uma frase que é: ‘mude o mundo, mas mantenha seus rituais’”, acrescenta Alexandra, que fará parte do Fórum ESG da Arena Fispal Tec, no próximo dia 20 de junho, no painel “Sustentabilidade no Prato: Inovação nos Alimentos, Transformando-os em Opções Saudáveis, Saborosas e Amigas do Meio Ambiente”.
O painel também contará com Alexandre Novachi, diretor de Assuntos Regulatórios & Científicos da ABIA; e Luiz Carlos Demattê, CEO da Korin Alimentos; com a moderação de Viviane Cremaschi Lima, coordenadora de Relacionamento com a Indústria do SENAI Instituto de Tecnologia.
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A empreendedora diz ainda que o leite de aveia “está cada vez mais acessível” e que a diferença de preço para o leite de vaca - que está caindo por conta do aumento da concorrência e da escala de produção - tem relação com a tributação.
“Quando as pessoas criticam o preço de produtos veganos e, no nosso caso, o preço do leite vegetal comparado ao leite de vaca, muitas vezes elas não entendem como é que esse preço foi construído. Resumindo, o leite vegetal hoje paga quase 5 vezes mais impostos do que o leite de vaca”, avalia.
Ainda assim, a bebida tem crescido em termos de adesão. E não se trata apenas do público de maior renda. O acesso a classes mais baixas também tem crescido, principalmente por conta do aumento da procura de pessoas de todas as classes por produtos isentos de conteúdo de origem animal e lactose.
Leia na íntegra a entrevista com Alexandra Soderberg, co-fundadora e CMO da Naveia.
Food Connection: O que te trouxe ao Brasil?
Eu sou sueca e vim ao Brasil para fundar a Naveia. Morava em Berlim. O meu marido (Felipe Melo) e sócio da Naveia, que é carioca, fundou a empresa junto comigo.
Mas foi justamente enquanto a gente morava fora e observava esse mercado de leites vegetais, e principalmente o do leite de aveia, que a gente entendeu o potencial enorme e o impacto que a gente pode gerar ao trazer o leite de aveia para o Brasil.
É o país que tem o maior rebanho de gado do mundo, tem mais vacas do que pessoas. Então, quando a gente fala de substituir o consumo de leite de vaca é algo que pode trazer um impacto enorme.
A empresa agora tem 3 anos de mercado, mas a história começa bem antes, porque a gente ficou um bom tempo, uns 2 anos, só desenvolvendo produto e a marca.
O começo foi desafiador porque a Naveia é a primeira empresa que trouxe essa tecnologia de enzimação da aveia, que é o que deixa o leite de aveia um produto mais saboroso comparado a outros leites vegetais, que a gente conhece mais no mercado.
FC: De onde vem a tecnologia do leite de aveia que vocês entregam?
Já havia essa tecnologia lá fora, ela foi inventada pelos suecos. Então, eu cresci tomando o leite de aveia, achando que o mundo inteiro tomava leite de aveia como eu conhecia, mas não é o caso.
Então, a gente estudou todo esse processo, que já é comum na Europa e hoje também nos Estados Unidos. Mas no Brasil ninguém trabalhava com isso. Foi um trabalho longo de criar toda essa cadeia do zero e ser o primeiro a criar essa cadeia usando a tecnologia de enzimação da aveia para trazer o resultado de um leite mais saboroso.
A gente teve a sorte de encontrar especialistas muito bons nessa área, que, desde o início, ajudaram a gente e estão juntos com a gente até hoje. Então, não estivemos sozinhos.
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FC: Como você avalia o mercado de plant-based no Brasil?
Acho que o mercado plant-based no Brasil está na segunda geração, numa fase mais desenvolvida. E isso é bom. Quando a gente tem um mercado competitivo, com muita startup já apostando nesse mercado plant-based, a competição vai melhorando os produtos no mercado inteiro.
Então, hoje eu acho que a gente já está mais à frente do que quando a Naveia começou.
Eu já vejo muitos produtos muito bons em todas as categorias. O sabor e a tecnologia que a gente usa está cada vez mais afinado. Ainda não estamos nas mesmas tecnologias em algumas áreas, como lá fora. Quando a gente vai para o mercado europeu ou americano, até asiático, já tem um histórico de mais tempo, então o mercado já conseguiu evoluir e ficar mais maduro, mas eu acho que o Brasil está indo muito rápido, então acho que a gente já está vendo mudanças muito grandes.
A gente tem supermercados, clientes, redes de no varejo onde a Naveia é líder desse segmento. A gente está conseguindo puxar essa categoria de leite vegetal e onde o leite vegetal já representa 25% do consumo de leite de leite geral, isso inclui todo o tipo de leite animal e vegetal.
Então, esse tipo de coisa era algo que a gente nem imaginava que em 3 anos já seria possível e a gente vê que realmente tem uma aderência muito forte. O público brasileiro busca essas opções e, diferentemente do que muitos acham, não é só o público A e B, vai para todas as faixas sociais que têm essa demanda. Ainda mais quando a gente fala sobre nichos, como os intolerantes à lactose. Não tem classe para intolerância a lactose, e isso é uma coisa muito comum hoje em dia.
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FC: O preço do leite vegetal ainda é uma barreira para o consumidor?
Está cada vez mais acessível (o leite de aveia). Ainda tem diferença de preço, mas cada vez menos. Além da concorrência, a escala também faz isso (derrubar o preço). Quando as pessoas criticam o preço de produtos veganos e, no nosso caso, o preço do leite vegetal comparado ao leite de vaca, muitas vezes eles não entendem como é que esse preço foi construído.
Resumindo, o leite vegetal hoje paga quase 5 vezes mais impostos do que o leite de vaca. A gente não recebe os subsídios em nível federal, estadual e municipal, que a indústria do leite recebe. A gente também não tem a mesma escala de produção. Isso é algo que a gente consegue mudar já com a aderência do consumidor.
Diferente do leite de vaca que envasa milhões e milhões de litros, o mercado de leite vegetal ainda envasa muito menos. E a gente tem custos maiores por causa da falta de escala comparada ao leite de vaca.
E, por último, a gente também tem as margens (de lucro) no supermercado. Isso também é algo que a gente consegue mudar com a escala. Está melhorando, mas a gente ainda enfrenta essa dificuldade. O supermercado vai aplicar uma margem muito mais alta no leite vegetal do que no leite de vaca, porque ele entende que esse produto é um produto de classe A e B. Aí a gente tem essa dificuldade de criar mais giro, mais acessibilidade.
Isso está mudando com o tempo também porque a gente mostra que há públicos diferentes que buscam essas opções, mas é um processo.
FC: Qual a vantagem do leite de aveia para outros leites vegetais?
Quando a gente fala do leite de aveia e do sucesso que ele teve lá fora e aqui no Brasil, o diferencial dele, comparado com outros leites vegetais, é o sabor, e outro ponto é a performance.
E quando eu falo de performance, eu falo do ritual sagrado do brasileiro do café com leite. No passado, a gente olhava para os leites vegetais que tinham no mercado, eles tinham muitas aplicações interessantes, mas na hora de misturar com café assustava muito as pessoas, porque não era uma experiência agradável, ficava aguado, coalhava, não era uma experiência parecida com o do leite de vaca.
Hoje, o leite de aveia permite essa experiência, esse ritual. A gente tem até uma frase que é: “mude o mundo, mas mantenha seus rituais”. A gente não está querendo tirar esses rituais de sabor, de memória afetiva que a gente associa à alimentação das pessoas, e o leite de aveia já permite isso.
FC: Quais outras aplicações do leite de aveia você pode destacar?
Uma tendência muito forte é o trabalho do barista profissional, que vaporiza o leite, que faz o latte art, que faz um bom cappuccino, quando ele realmente consegue vaporizar bem.
O leite vegetal também representava dificuldades no passado para esses baristas, então eles nem gostavam de trabalhar com leite vegetal por causa do fato de que não vaporizava, não criava uma bebida boa comparada ao leite de vaca.
E o leite de aveia entra nessa cena de café surpreendendo os baristas.
Hoje, a Naveia investe muito nessa área de cafeterias. A gente tem uma equipe grande de baristas. Os dois últimos campeões brasileiros de latte art, que foram para os campeonatos mundiais na Itália, em Taiwan, são nossos baristas, representam a Naveia, e eles falam que cada vez mais as cafeterias e os baristas preferem trabalhar com leite vegetal quando é Naveia, porque eles conseguem fazer tudo, o cliente não reclama.
Além disso, é muito mais inclusivo, a partir do momento que eu tenho uma bebida que entrega o mesmo resultado e a mesma experiência sensorial para o cliente vegano, intolerante à lactose, pessoa com APLV (alergia à proteína do leite de vaca) etc.
Mesmo para quem consome o leite de vaca, o leite vegetal é mais uma opção de produto que pode ser usado em bebidas e receitas, como temos o leite de coco na cultura brasileira. O Naveia nasceu como um produto vegano feito para um público não vegano. Quem consome derivados de animais e na hora do café com leite toma o leite Naveia não está renunciando a nada, não é um sacrifício, é mais uma opção.
Esse é o impacto que a gente consegue criar com a indústria de alimento, com a engenharia de alimento, para levar cada vez mais soluções viáveis e escaláveis, sem que o consumidor renuncie a algo que o agrade, mantendo uma experiência não só mais saborosa, mas também mais sustentável e saudável.
FC: Além do leite de aveia, quais outros produtos a Naveia oferece hoje?
Hoje a gente já tem uma linha culinária completa para atender o setor de A&B, que tem cada vez mais demandas. Por exemplo, a gente desenvolveu um chantilly de aveia que entrega a mesma performance do chantilly de origem animal, porque a gente tinha muitas redes de cafeteria como clientes, que faziam uma bebida com leite de aveia, mas na hora de criar a bebida completa, como um frappuccino com chantilly, eles não conseguiam entregar a bebida 100% sem lactose ou 100% vegano, dependendo do consumidor que estava comprando.
A gente desenvolveu também um creme de cacau e avelã, que é muito forte no mercado brasileiro, usando como base o nosso leite de aveia em pó, e conseguiu mudar essa fórmula tradicional e fazer um produto muito gostoso vegano.
A gente tem manteiga, chantili, creme de leite, e o recente é o leite condensado. Então são vários produtos para atender padarias, cafeterias, todo esse segmento.
FC: Quais os próximos passos da Naveia?
A gente investe muito nessa área de pesquisa e desenvolvimento, tentando trazer o que há de melhor no momento no mundo de tecnologia, de engenharia de alimentos, para trazer lácteos vegetais de todos os tipos para o Brasil.
No leite, por exemplo, e produtos como a manteiga, a gente está ali junto com o que há de mais inovador no mercado mundial. A gente vai para todas essas feiras lá fora, e a gente está realmente nesse mesmo estágio de desenvolvimento e de engenharia que a gente tem no mercado no exterior.
Mas como eu falei no início, a Naveia foi primeira a trazer esse processo de enzimação para o Brasil, isso é uma coisa que a gente continua fazendo, mas sempre aperfeiçoando, não é porque a gente agrada os nossos clientes com nossos produtos que a gente não vê a necessidade de tentar melhorar constantemente, porque eu acho que quando a gente fala de inovação e desse mercado plant-base, o tempo inteiro a gente tem que se desafiar para procurar melhorar.
Eu acho que o Brasil, pelo tamanho que ele tem de indústria e da relevância que em relação à América Latina, já tem estrutura muito avançada de conhecimento e especialistas comparado a outros países latino-americanos, em várias áreas e no leite vegetal também. Eu acho que o Brasil está realmente à frente.
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